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2023

ANUÁRIO DO HOSPITAL
DONA ESTEFÂNIA

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Determinação da IgE específica para clara em crianças com alergia ao ovo

Joana Bruno Soares1, Pedro Martins2,3, Virginia Loureiro4, Paula Leiria Pinto2,3

1. Serviço de Imunoalergologia, Hospital Santa Maria, Centro Hospitalar Lisboa Norte
2. Serviço de Imunoalergologia, Hospital de Dona Estefânia, Centro Hospitalar de Lisboa Central
3. CEDOC, Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Nova de Lisboa
4. Serviço de Patologia Clínica, Centro Hospitalar de Lisboa Central

O ovo é um dos alimentos que mais frequentemente causa alergia alimentar em idade pediátrica, sendo a clara do ovo habitualmente responsável por reacções mais graves que a gema. O diagnóstico desta entidade, tal como para outros alimentos, baseia-se numa história clínica detalhada, testes cutâneos em picada (TCP) com extractos comerciais e na determinação de IgE específi cas. Em última análise, uma prova de provocação oral (PPO) é necessária para confi rmar a existência de alergia ou tolerância, exame este que constitui até à data o gold-standard para o diagnóstico definitivo1. A fim de avaliar o valor limiar de IgE específica para clara de ovo que melhor se associou com tolerância clínica, analisámos retrospectivamente todas as crianças que realizaram PPO com ovo cozinhado, de Janeiro de 2010 a Dezembro de 2012, e que tinham efectuado doseamento de IgE específica (método ImmunoCAP®, Phadia – Thermo Fisher Scientific) nos 6 meses anteriores à prova. De um total de 48 crianças incluídas (60% do género masculino), 33 (69%) apresentavam história prévia de reacção após ingestão de ovo, enquanto nas restantes a evicção foi recomendada pela existência de testes cutâneos positivos e IgE específica para ovo aumentada. No primeiro grupo a principal forma de apresentação foi de carácter mucocutâneo isolado (30 crianças).

Foram reportadas situações sugestivas de anafilaxia em duas crianças. A mediana de idades na altura do diagnóstico foi de 1,0 ano (P25–P75: 0,7– 1,1 anos) e na data da PPO foi de 3,0 anos (P25–P75: 2,0–5,0 anos). A maioria das PPO realizadas (39 provas) foi negativa. Das 9 PPO positivas, duas foram com anafilaxia. O melhor limiar de decisão para a IgE específica para ovo, calculado através de curva de ROC, foi de 5,63 kU/L (sensibilidade de 55,6%, especificidade de 89,7%, valor preditivo positivo de 55,6% e valor preditivo negativo de 89,7%). É importante salientar que níveis inferiores a este limiar se associaram com PPO positivas em 4 crianças (de um total de 39 crianças com valores inferiores a 5,63 kU/L), em um dos casos com anafilaxia (IgE específica de 0,79 kU/L). De referir que, na nossa amostra, o limiar de decisão associado com um valor preditivo positivo de 100% foi de 17,4 kU/L, sugerindo que as crianças com valores de IgE acima deste limiar apresentem um risco elevado de positividade nas PPO. Apesar de ser aceite a ideia de que valores elevados de IgE específica se associam a maior probabilidade de positividade das provas de provocação2,3, não está claramente estabelecido o valor de cut-off determinante da probabilidade de tolerância. Os valores reportados por vários autores variam entre 0,35 e 25,5 KU/L de IgE específica para clara de ovo, reflectindo diferenças entre as populações estudadas, desenho dos estudos, faixas etárias e forma de preparação do ovo usado nas PPO (cru ou cozinhado) 4-7. Tendo em conta estes aspectos e a dimensão da nossa amostra, estamos cientes de que os nossos resultados não podem ser extrapolados para outras populações. A PPO continua a ser o gold-standard para o diagnóstico de alergia ao ovo, no entanto a história clínica associada a testes cutâneos por picada e a doseamento de IgE específicas poderão ser suficientes para estabelecer o diagnóstico, especialmente em crianças mais novas. Apesar de valores mais elevados de IgE especifica se associarem com ausência de tolerância ao ovo, deve-se ter em conta que valores baixos de IgE especifica podem-se associar com PPO positivas.

Rev Port Imunoalergologia 2014; 22 (2): 139-140

Palavras-chave: (não aplicável)