imagem top

2023

ANUÁRIO DO HOSPITAL
DONA ESTEFÂNIA

CHULC LOGOlogo HDElogo anuario

URGÊNCIAS TORÁCICAS EM PEDIATRIA

Maria do Rosário Matos

Serviço de Radiologia do Hospital Dona Estefânia – Centro Hospitalar de Lisboa Central, Lisboa. Coordenação do Serviço - Dra. Eugénia Soares

Congresso nacional de Radiologia (CNR) 2014, Curso Pré-Congresso
7 e 9 de Maio de 2014 em Tróia

Objectivos: Propõe-se uma revisão da semiologia radiológica das diferentes urgências torácicas não traumáticas em pediatria, e a melhor estratégia a adotar na investigação imagiológica.

Avaliação Imagiológica: A radiografia simples do tórax permanece o exame de primeira linha na avaliação de situações agudas, tal como a infeção respiratória ou a inalação de corpo estranho, e serve de base para a caracterização ecográfica do derrame pleural e das massas mediastínicas. A Tomografia Computorizada pode ser necessária para dar uma informação rápida nas situações de massas pulmonares e mediastínicas, e na evolução clínica desfavorável de pneumopatias, bem como no despiste de malformações congénitas vasculares e dos pulmões. A Ressonância Magnética é mais frequentemente realizada para caracterização de massas mediastínicas e malformação congénitas. É uma técnica menos disponível, recorrendo-se apenas em algumas situações pontuais na urgência.

Urgências torácicas: As urgências torácicas não traumáticas nas crianças têm elevada prevalência e morbilidade. O radiologista deve estar apto a reconhecer o amplo espectro de situações de urgência torácica em pediatria, que variam com o escalão etário, e estar familiarizado com a embriologia, reconhecer a anatomia e fisiologia particulares do tórax na criança e consequente patologia. Na abordagem imagiológica devem considerar-se as consequências da exposição à radiação ionizante que são mais nocivas em idade pediátrica.

Período neonatal: É importante reconhecer os padrões radiográficos das principais patologias que estão na base da insuficiência respiratória grave no recém-nascido. As doenças respiratórias mais frequentemente encontrados na Unidade de Cuidados Intensivos Neonatais (UCIN) incluem a Imaturidade Pulmonar por défice de surfactante, ou Doença da Membrana Hialina, e suas complicações, das quais salientamos o barotrauma decorrente da ventilação. No barotrauma, a rutura das junções bronquíolo-alveolares pode levar a um enfisema pulmonar intersticial com eventual progressão para pneumotórax e pneumomediastino, e displasia bronco-pulmonar. Consideram-se neste período também a Taquipnéia Transitória do Recém-Nascido (TTN), a pneumonia neonatal e o Síndrome de Aspiração de Mecônio (SAM). Recém-nascidos com estas condições são geralmente avaliados com radiografias de tórax. Ainda no período neonatal, consideram-se as malformações da árvore traqueo-brônquica, pulmão, cardio-vasculares e defeitos do diafragma. A informação clínica é fundamental para a correta interpretação das imagens, tal como os aspetos descritos nas ecografias obstétricas, a idade gestacional, o tipo de parto, e outros fatores que envolvem o nascimento.

Aspiração de corpo estranho: O intervalo de idades mais atingido é o dos 3 aos 6 meses de idade. O corpo estranho pode situar-se em qualquer ponto ao longo da via aérea das crianças. Os sintomas incluem asfixia, pieira, tosse e dispneia, e a broncoscopia para a remoção do objecto é mandatória. Na suspeita de aspiração de corpo estranho, realiza-se radiografia do tórax eventualmente complementada com incidências de perfil e expiratória. É característica a presença de áreas de air trapping decorrentes da obstrução. Radiografias negativas não devem protelar a broncoscopia numa criança com uma história clínica e exame objetivo a favor da aspiração de corpo estranho.

Infecções pulmonares: As infeções do trato respiratório inferior são uma das indicações mais comuns da imagiologia do tórax em pacientes pediátricos. As infecções virais são as mais frequentes. Quando significativas, cursam com edema peri-brônquico, traduzindo-se na radiografia como opacidades lineares peri-hilares bilaterais, espessamento peri-brônquico, hiperinsuflação e air trapping. Há 30 % de falsos negativos. A pneumonia bacteriana traduz-se geralmente numa radiografia de tórax como uma opacidade focal do espaço aéreo sem perda de volume associada. A pneumonia pode ser complicada por derrame pleural, ou evoluir com necrose do parênquima, situações em que respetivamente a ecografia e a tomografia computorizada dão uma informação adicional.

Malformações Vasculares: Os anéis vasculares, malformações potencialmente compressivas, eventualmente sugeridos em estudos contrastados do tubo digestivo e ecocardiograma, e devem ser confirmados por angioTC ou angioRM. As reconstruções volumétricas são úteis na compreensão da anatomia e preparação cirúrgica. A elevada resolução espacial, maior rapidez de execução e o facto de poder dispensar a necessidade de anestesia, faz da angioTC o estudo mais realizado, mesmo nas crianças pequenas, apesar da exposição à radiação ionizante. A obstrução das vias aéreas pode cursar com enfisema obstrutivo ou atelectasia. Na criança mais velha e colaborante, a ressonância deve ser realizada se disponível. As compressões vasculares da via aérea incluem o duplo arco aórtico, a artéria aorta direita com a subcávia esquerda aberrante e o sling da artéria pulmonar esquerda.

Patologia Pulmonar congénita: A Malformação Adenomatóide Quística, uma lesão comunicante com a via aérea, pode estar na base de uma situação de urgência quando tem um efeito compressivo importante no parênquima, ou quando aumenta de dimensões por hiperinsuflação associada a infecção. O mesmo pode ocorrer no enfisema lobar congénito. Os quistos entéricos podem ter também efeitos compressivos, e entram no diagnóstico diferencial.

Massas torácicas: A causa mais frequente de compressão da traqueia e brônquios é a presença de uma massa mediastínica. As causas de alargamento do mediastino variam de acordo com o grupo etário, na infância predominando o teratoma, neuroblastoma, linfangioma e malformações cardiovasculares, na criança mais velha a leucemia/linfoma. Na avaliação destas situações a radiografia do tórax (face e perfil) é complementada com ecografia, TC e RM.

Conclusão: De acordo com as especificidades inerentes a cada escalão etário e apresentação clínica das urgências torácicas, focam-se os achados imagiológicos de causas adquiridas e congénitas das patologias torácicas mais frequentes no âmbito da urgência.

Bibliografia
Jeffrey R Brooke, MD, Diagnostic Imaging: Emergency Amyrsis 1st edition, 2007
Charlotte de Lange, Radiology in paediatric non-traumatic thoracic emergencies. Insights Imaging (2011) 2:585–598
Breysem L et al, Pediatric emergencies: thoracic emergencies. Eur Radiol (2002) 12:2849-2865
Agrons G et al, From the Archives of the AFIP Lung Disease in Premature Neonates: Radiologic-Pathologic Correlation. RadioGraphics 2005; 25:1047–1073

1
Figura 1 – Doença da Membrana Hialina. Radiograma de um recém-nascido com extrema prematuridade de 24 semanas, mostra um padrão reticular e micronodular (A); numa outra criança um enfisema instersticial pulmonar, pneumotórax e pneumoperitoneu por barotrauma (B) decorrente da ventilação.

2
Figura 2 – Hérnia de Bochdaleck

3
Figura 3 – Pneumonia redonda (A) com resolução completa ao 20.º dia (B)

4
Figura 4 – Malformação Adenomatóide quística. No primeiro dia demonstram-se áreas opacidade e de hiperlucência no campo pulmonar esquerdo, associado a desvio contralateral do mediastino (A); no 3.º dia de vida verifica-se hiperlucência da lesão que assume características quisticas