1- Serviço de Pediatria, Hospital Espírito Santo, EPE, Évora;
2- Departamento de Pediatria Médica, Hospital de Dona Estefânia, Centro Hospitalar Lisboa Central, EPE, Lisboa;
3- Unidade de Cuidados Intermédios Neonatais, Maternidade Alfredo da Costa, Centro Hospitalar Lisboa Central, EPE, Lisboa;
4- Unidade de Cuidados Intensivos Pediátricos, Hospital de Dona Estefânia, Centro Hospitalar Lisboa Central, EPE, Lisboa;
5- Serviço de Neuropediatria, Hospital de Dona Estefânia, Centro Hospitalar Lisboa Central, EPE, Lisboa.
- 14º Congresso Nacional de Pediatria, 2013
Introdução: A Neurofibromatose tipo 1 (NF1) é uma síndrome neurocutânea autossómica dominante cujas características principais são os neurofibromas e as manchas café com leite. A sua incidência está estimada em 1:3000 nados vivos. A idade de apresentação e as manifestações clínicas têm grande variabilidade intrafamiliar e interindividual. O espetro de gravidade abrange casos assintomáticos e situações com morbilidade e mortalidade significativa. Os primeiros sinais podem surgir em qualquer fase da vida, inclusive no período perinatal. Relata-se uma forma de apresentação rara e grave no período neonatal cuja evolução clínica faz prever um prognóstico reservado com implicações na atitude terapêutica.
Descrição do caso: Recém-nascido masculino, filho de mãe com NF1. Gravidez vigiada que decorreu com restrição do crescimento intra-uterino e pré eclâmpsia. Cesariana às 34 semanas. Baixo peso ao nascer. No exame objetivo salientava-se, à direita, exoftalmia, tumefacção subcutânea na pálpebra superior e região cervical e curvatura da perna. A ressonância magnética crânio-encefálica revelou displasia da asa do esfenóide à direita e múltiplas lesões nos nervos cranianos e raquidianos compatíveis com neurofibromas, assumindo-se o diagnóstico de NF1. A telerradiografia da perna evidenciou displasia da tíbia. Alta da maternidade no 25º dia de vida com orientação multidisciplinar. A evolução clínica foi complicada aos 4 meses por hematoma subdural e hidrocefalia com necessidade de derivação ventricular externa. Detetada fratura da tíbia direita com evolução para pseudoartrose. Atualmente com 6 meses de vida mantem internamento. Ventilação espontânea por traqueostomia e alimentação por gastrostomia percutânea. O controlo clínico e imagiológico revela progressão na extensão dos neurofibromas plexiformes centrais e periféricos (paravertebral torácico inferior e retroperitoneal). O envolvimento de estruturas vitais determina a sua irressecabilidade.
Discussão: Muitas das manifestações clínicas e complicações da NF1 são características de determinada idade. A apresentação no período neonatal não é muito comum. O presente caso documenta manifestações infrequentes mas típicas desta fase: os neurofibromas plexiformes, com característico envolvimento da órbita e pálpebra superior; a displasia da asa do esfenóide com protusão ocular e a displasia congénita da tíbia com potencial de evolução para pseudoartrose. Estão reunidos critérios para o diagnóstico de NF1 disseminada que se associa a uma taxa de mortalidade elevada. A discrepância da gravidade do quadro clínico desta díade mãe-filho ilustra a variabilidade extrema da expressão fenotípica do gene NF1 que dificulta o aconselhamento genético. Embora se possa prever o diagnóstico pré-natal, não se consegue contornar a imprevisibilidade da clínica e do prognóstico. Atualmente a abordagem da NF1 consiste na detecção precoce das complicações passíveis de tratamento. A remoção cirúrgica dos neurofibromas plexiformes tem apenas indicação quando o crescimento tumoral compromete estruturas vitais ou resulta num desfiguramento cosmético. Por vezes, a extensão tumoral inviabiliza a ressecção completa. A esta problemática acresce a eventualidade de recidiva tumoral nos casos de excisão incompleta, o que levanta dilemas na abordagem clínica, muitas vezes restringida a efeitos paliativos. Estão em fase de ensaio clínico fármacos para redução do volume dos neurofibromas plexiformes (interferão alfa, imatinib) que estamos atualmente a considerar no presente caso.
Palavras-chave: Neurofibromatose tipo 1, neurofibroma plexiforme, displasia da asa do esfenóide