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2023

ANUÁRIO DO HOSPITAL
DONA ESTEFÂNIA

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UM CASO DE PÚRPURA HENOCH-SCHÖNLEIN COM EVOLUÇÃO MENOS COMUM

Filipa Marujo1, Pedro Pires2, Sara Nóbrega3, Marta Conde4, Mário Coelho1

1 - Unidade de Pediatria Geral, Área da Mulher, Criança e Adolescente, Hospital Dona Estefânia, Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Central, Lisboa
2 - Área da Cirurgia Pediátrica, Área da Mulher, Criança e Adolescente, Hospital Dona Estefânia, Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Central, Lisboa
3 - Unidade de Cuidados Especiais Respiratórios e Nutricionais, Área da Mulher, Criança e Adolescente, Hospital Dona Estefânia, Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Central, Lisboa
4 - Unidade de Reumatologia, Área da Mulher, Criança e Adolescente, Hospital Dona Estefânia, Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Central, Lisboa

- Reunião institucional – Reunião temática semanal da Área da Mulher, Criança e Adolescente do Hospital Dona Estefânia, 3 de abril de 2018

Resumo:
Introdução: A púrpura Henoch-Schönlein (PHS) é a vasculite sistémica mais frequente em idade pediátrica, afectando, aproximadamente, 20 em cada 100 000 crianças por ano. Caracteriza-se pela deposição de imunocomplexos de IgA nas paredes dos pequenos vasos conduzindo a sintomas que envolvem mais frequentemente a pele, articulações, sistema gastro-intestinal e renal. Embora a etiologia seja desconhecida, a PHS é frequentemente precedida por uma infecção aguda, sugerindo assim a existência de um trigger infecioso. Existe também alguma evidência que outros antigénios, como alimentos, fármacos ou vacinas, se podem relacionar com a sua etiologia.
Relato de caso: Apresentamos o caso de um menino de 3 ano que, na véspera do internamento, recorreu ao serviço de urgência por angioedema, interpretado como reacção adversa a β-lactâmicos que tinha iniciado 48 horas antes para otite média aguda. Regressa 18 horas depois por dor abdominal e aparecimento de exantema disperso com algumas lesões de púrpura palpável nos membros inferiores. A ecografia abdominal revelou invaginação íleo-ileal fixa, que foi refractária ao tratamento conservador e evoluiu com hematoquézias por sofrimento de ansa. É submetido a ressecção segmentar de fragmento necrótico do íleon cuja anatomia patológica revelou lesões de vasculite leucocitoclástica associadas a alterações isquémicas. Analiticamente, pesquisa de antigénio do Streptococcus pyogenes na orofaringe positiva e diminuição transitória do complemento C3. Sempre sem alterações sugestivas de envolvimento renal. Estudo de auto-imunidade normal. A corticoterapia foi protelada no pós-operatório imediato, dada a sua implicação na cicatrização. Contudo, em D11 de doença ocorreu agravamento da púrpura e surgiram artralgias das tibio-társicas, edema e dor testicular, tendo sido iniciada metilprednisolona com melhoria clínica. Teve alta em D14 de internamento sob corticoterapia sendo reinternado 3 dias depois por novo agravamento da dor abdominal com hematoquézia, sem evidência de nova invaginação intestinal. Colocado em pausa alimentar e já com perda ponderal significativa, foi necessária alimentação parentérica total. Após estabilização re-introduziu progressivamente a alimentação entérica sem agravamento. Teve alta ao 24º dia de internamento, sem outras queixas, nomeadamente envolvimento renal. No seguimento em consulta não voltou a apresentar sinais de vasculite activa.
Conclusão: PHS é tipicamente auto-limitada na criança, com resolução clínica em 4 a 6 semanas, podendo, no entanto, surgir complicações. 66% dos doentes podem apresentar sintomas gastro-intestinais, nomeadamente dor abdominal (44%), hemorragia intestinal (22%) ou invaginação (≤3%). O tratamento com corticoides é reservado para os doentes que apresentam complicações e as recidivas podem ocorrem em cerca de 33% dos doentes em idade pediátrica. Apesar da inúmera investigação, ainda não foi possível compreender o papel do Streptococcus pyogenes na fisiopatogenia da PHS.

Palavras Chave: invaginação intestinal, Púrpura de Henoch-Schölein