imagem top

2023

ANUÁRIO DO HOSPITAL
DONA ESTEFÂNIA

CHULC LOGOlogo HDElogo anuario

ASMA GRAVE NA CRIANÇA

João Gaspar Marques1,2

1 - Serviço de Imunoalergologia, Hospital de Dona Estefânia, Centro Hospitalar de Lisboa Central, EPE
2 - CEDOC, Integrated Pathophysiological Mechanisms Research Group, Nova Medical School, Campo dos Mártires da Pátria, 1150-190 Lisbon, Portugal

- 36ª Reunião Anual da Sociedade Portuguesa de Alergologia e Imunologia Clínica, 7 a 9 de Outubro de 2016, Lisboa (Workshop - Comunicação Oral)
- Revista Portuguesa de Imunoalergologia 2016; 24: Suplemento (Resumo)

A asma grave em idade pediátrica atingirá cerca de 5% das crianças com asma sendo, no entanto, responsável por cerca de 30 a 50% dos custos associados à asma nesta faixa etária1. O conhecimento atual relativamente à etiopatogenia e ao tratamento da asma grave nesta faixa etária é dificultado por diversos factores, nomeadamente pelas mais de 60 definições operacionais de asma grave publicadas na literatura ao longo do tempo2.
A definição atual de asma grave surge de uma publicação conjunta entre a European Respiratory Society e a American Thoracic Society3, publicada em 2014, sendo uma tentativa de uniformização desta mesma definição. De acordo com o documento atrás citado, a asma grave define-se, em crianças com 6 ou mais de idade, como:

Definição de asma grave em doentes com ≥ 6 anos

Asma que requer terapêutica nos patamares 4-5 das recomendações do GINA (ICS em doses altas e LABA ou modificador dos leucotrienos/teofilina) no último ano ou corticoterapia sistémica durante ≥ 50% do ano anterior para prevenir que ficasse “não controlada” ou que permanecia “não controlada” apesar desta terapêutica.

O “não controlo” da asma define-se pela presença de pelo menos um dos seguintes:

1 – Mau controlo sintomático: ACQ consistentemente>1,5; ACT<20 (ou “não bem controlado” de acordo com as recomendações do GINA)

2 – Exacerbações graves frequentes: dois ou mais ciclos de corticoterapia sistémica (>3 dias cada) no último ano

3 – Exacerbações severas: pelo menos um internamento, necessidade de cuidados intensivos ou ventilação mecânica no último ano

4 – Obstrução brônquica: após broncodilatação adequada manter FEV1<80% do valor previsto (na presença de uma razão FEV1/FVC diminuída em relação ao limite inferior do normal)

GINA: Global Initiative for Asthma; ICS: corticóides inalados; LABA: Beta2-agonista de longa duração de ação; ACQ: Asthma Control Questionnaire; ACT: Asthma Control Test

Referência: Adaptado de Eur Respir J. 2014;43(2):343-73.

Esta definição assume que a definição de asma grave é transversal às diversas faixas etárias a partir dos 6 anos de idade, havendo apenas diferenciação sobre as doses consideradas elevadas de corticóides inalados. As recomendações mais recentes do GINA4, publicadas já em 2016, definem as doses elevadas de corticoides inalados como:

Doses elevadas de corticóides inalados

Idade ≥ de 12 anos:

· > 800 microgramas de budesonida (DPI)

· > 500 microgramas de propianato de fluticasona (DPI)

· > 500 microgramas de propianato de fluticasona (HFA)

· > 400 microgramas de beclometasona (HFA)

Idade entre 6 e 11 anos:

· > 400 microgramas de budesonida (DPI)

· > 400 microgramas de propianato de fluticasona (DPI)

· > 500 microgramas de propianato de fluticasona (HFA)

> 200 microgramas de beclometasona (HFA)

DPI: Inalador de pó seco; HFA: propelente hidrofluoralcano 

Referência: Adaptado de “Global Initiative for Asthma. Global strategy for asthma management and prevention. Updated 2016”.

Na abordagem diagnóstica destes doentes é fundamental distinguir entre os doentes com asma difícil de tratar e os doentes com asma grave refractária à terapêutica. Nos doentes com asma difícil de tratar dever-se á avaliar a presença de diagnósticos diferenciais e comorbilidades, a má adesão terapêutica e a interferência de factores psicológicos. Estes doentes só deverão ser candidatos a terapêuticas inovadoras quando a gravidade dos sintomas se mantiver apesar da optimização dos factores atrás citados1. A asma grave refractária à terapêutica, por definição, é assumida quando se exclui estar perante uma asma difícil de tratar1.
O conhecimento da patobiologia da asma grave5 e dos seus diversos endótipos é fundamental na eventual decisão terapêutica por fármacos biológicos1. Em termos clínicos e patológicos a asma grave nas crianças tem um comportamento diferente dos adultos, nomeadamente2:
· Nos adultos habitualmente há um padrão persistente de queixas em oposição às crianças em que há um padrão de exacerbações frequentes e graves, progredindo rapidamente.
· Nas crianças há um maior atingimento das vias aéreas mais distais e, por vezes, ausência de atingimento das grandes vias aéreas.
Em termos terapêuticos, resultado das lacunas de conhecimento em idade pediátrica, muitas das recomendações são geradas por extrapolação dos adultos2. Presentemente urge encontrar biomarcadores práticos e acessíveis que otimizem o seguimento e terapêutica das crianças com asma grave6.
A asma grave tem um forte impacto na qualidade de vida das crianças, conduzindo a problemas emocionais e comportamentais nas mesmas, bem como a problemas emocionais nos cuidadores7. A constituição de equipas multidisciplinares é fundamental para o correto acompanhamento de crianças com asma grave, permitindo que estas cheguem à idade adulta livres de sintomas, mantendo uma função pulmonar adequada e com uma ótima qualidade de vida.

Referências:
1 - Bozzetto S, Carraro S, Zanconato S, Baraldi E. Severe asthma in childhood: diagnostic and management challenges. Current Opinion in Pulmonary Medicine. 2015;21(1):16-21.
2 - Guilbert TW, Bacharier LB, Fitzpatrick AM. Severe asthma in children. The Journal of Allergy and Clinical Immunology In practice. 2014;2(5):489-500.
3 - Chung KF, Wenzel SE, Brozek JL, Bush A, Castro M, Sterk PJ, et al. International ERS/ATS guidelines on definition, evaluation and treatment of severe asthma. Eur Respir J. 2014;43(2):343-73.
4 - Global Initiative for Asthma. Global strategy for asthma management and prevention. Updated 2016.
5 - Trejo Bittar HE, Yousem SA, Wenzel SE. Pathobiology of severe asthma. Annu Rev Pathol. 2015;10:511-45.
6 - Pijnenburg MW, Szefler S. Personalized medicine in children with asthma. Paediatric respiratory reviews. 2015;16(2):101-7.
7 - Booster GD, Oland AA, Bender BG. Psychosocial Factors in Severe Pediatric Asthma. Immunol Allergy Clin North Am. 2016;36(3):449-60.

Palavras-chave: asma grave, criança