1 - Unidade de Cuidados Intensivos Pediátricos, Hospital Dona Estefânia, Centro Hospitalar Lisboa Central, E.P.E.;
2 - Unidade de Infecciologia, Hospital Dona Estefânia, Centro Hospitalar Lisboa Central, E.P.E.;
3 - Serviço de Neurologia Pediátrica, Hospital Dona Estefânia, Centro Hospitalar Lisboa Central, E.P.E.;
4 - Serviço de Neurorradiologia, Hospital Dona Estefânia, Centro Hospitalar Lisboa Central, E.P.E.
- AEP 2012 – 61º Congreso de la Asociación Española de Pediatría, Granada, 31 Mai-2 Jun 2012 (Comunicação oral).
Introdução: Os enterovírus afectam principalmente crianças, causando doença mãos, pés, boca (DMPB). As complicações neurológicas (paralisia flácida, rombencefalite) e sistémicas (edema pulmonar e colapso cardiorrespiratório) são raras. Estes vírus ocorrem por surtos e os serótipos variam de região para região. O enterovírus 71 (EV71), responsável por epidemias recorrentes e doença grave na Ásia/Pacífico, nunca tinha sido previamente descrito em Portugal.
Caso clínico: Lactente, 17 meses, saudável, transferido para o nosso hospital por tetraparésia flácida rapidamente progressiva com dois dias de evolução, associada a letargia, hiporreflexia periférica e abolição de reflexos do tronco cerebral (TC) à excepção dos fotomotores, sinais meníngeos e íleus intestinal. História prévia de infecção respiratória, diarreia, febre e lesões da mucosa oral. Perante a hipótese de romboencefalite ou encefalomielite disseminada aguda e atendendo à gravidade, foi medicado com ceftriaxone, aciclovir, ciprofloxacina, imunoglobulina e corticoterapia.
A situação complicou-se de edema agudo do pulmão com quatro paragens cardíacas nas primeiras 12 horas de internamento que responderam às manobras de reanimação cardiorrespiratória avançada. Instalaram-se hipoperfusão e disfunção ventricular esquerda, que reverteram com suporte inotrópico. Os electroencefalogramas revelaram disfunção encefálica difusa. O exame citoquímico do líquor em D3 de internamento foi normal. Imunoglobulinas séricas (antes da administração de imunoglobulina) e no líquor foram normais. A ressonância magnética (RM) encefálica/medular em D5 demonstrava encefalopatia hipóxico-isquémica, mas também lesões no tegmen bulbar, protuberância, núcleos dentados e segmento adjacente do cerebelo, aspectos sugestivos de rombencefalite a enterovírus. A Polimerase chainreaction para enterovírus no líquor foi negativa, mas positiva nas fezes e na cultura identificou-se EV71 genótipo C2. Foi negado contexto epidemiológico com países asiáticos e feita notificação à Direcção geral de Saúde. Evoluiu para tetraparésiaespástica com hiperreflexiaosteotendinosa e diplegia facial, com recuperação parcial dos reflexos do TC. Por ausência de reflexo faríngeo e hipoventilação central, foi traqueotomizado em D34. RM encefálica/medular em D50 revelou evolução para cavitação nas lesões previamente descritas no TC e medula cervical, atrofia encefálica difusa e lesões cortico-subcorticais hipóxico-isquémicas.
Conclusões:Este caso é um alerta da emergência do EV71 na Europa. Este vírus, nomeadamente este genótipo, cursa com elevada morbilidade e mortalidade, sobretudo abaixo dos cinco anos de idade. Não havendo terapêutica comprovadamente eficaz, o uso de corticoides e imunoglobulina poderá ser benéfico. Intervenções para controlar as epidemias, como o desenvolvimento de vacinas, estão em curso.
Keywords: Enterovirus 71, severe disease, neurological complications, emergent disease.